Jah9 sopra seu encanto feminino entre os leões do reggae

Poeta e iogue, a jovem estrela jamaicana respira e canta: ‘Uma mulher espiritualizada é a maior ameaça ao status quo.”
Apesar de ser dominado por leões, que rugem cheios de ritmo e testosterona, com suas fartas jubas jogadas ao vento, a grande savana do reggae também é povoada por um bom número de leoas, igualmente imponentes, poderosas e musicais. Basta uma breve caçada na mente para lembrar de Rita Marley, Judy Mowatt, Marcia Griffiths, Lady Saw, Sister Nancy, Dawn Penn, Patra, Kofi, JC Lodge, Althea & Donna, Carroll Thompson e Puma Jones, entre outras feras. E embora ainda não liderem seus grupos, como no mundo animal, uma nova geração dessas felinas, lideradas por nomes como Jah9, está promovendo uma saudável mudança de hábitos na selva do mercado, em busca de igualdade e de mais espaços, nem que seja para girar as garras.
– Não gosto de pensar numa luta ou numa batalha para que possamos nos impor num universo machista como o do reggae ou qualquer outro. Prefiro pensar numa conquista gradual de espaços, feita com atitude, firmeza e suavidade, capazes de conscientizar aqueles que ainda não entenderam que um sexo não é superior ao outro – diz ela, poeta, cantora, pensadora rasta e professora de ioga, que sopra seus encantos musicais neste domingo no Rio, no HUB (Av. Prof. Pereira Reis, 54, Santo Cristo), a partir das 19h, na abertura da temporada de bailes “O eterno verão do dub” (gostei), promovidos pelo Digitaldubs.
O modo articulado e sagaz como Jah9 se expressa – ou, se preferir, Janine Cunningham, nascida em Falmouth, Trelawny , no interior da Jamaica – não é por acaso. Filha de um pastor e de uma assistente social (“Minha espiritualidade e meu ativismo estão no sangue”), ela cresceu no campo, cercada de livros e poesia por toda a parte. A música – que hoje conduz sua vida – só entrou em modo “play” quando ela já era uma adolescente, morando e estudando em Kingston.
– Lia e escrevia poesia desde pequena. Ouvia os clássicos do reggae, como Burning Spear, Dennis Brown, Bob Marley, mas nunca pensei em seguir carreira – conta ela, que se formou em administração na Universidade das Índias Ocidentais, onde também descobriu a filosofia rasta. – Foi só na faculdade que ouvi falar de poetas dub como Mutabaruka e Linton Kwesi Johnson. Me aproximei também dos ensinamentos de Sua Majestade Haile Selassie. Passei a ver o rasta como uma filosofia, mais do que uma religião. E, então, tudo se encaixou para mim. Larguei o mundo corporativo e me encontrei espiritualmente na música.
Apadrinhada pelo sempre afinado Beres Hammond, ela adotou o atual nome artístico – o 9 vem de “femiNINE” – e gravou uma série de singles até chegar ao primeiro álbum, “New name”, produzido pelo mestre do dancehall, Rory ‘Stone Love’ Gilligan e lançado em 2013. Mas foi só no segundo álbum, “9”, lançado em 2016, que ela firmou seu estilo, de letras conscientes – “Uma mulher espiritualizada é a maior ameaça ao status quo/Os frutos que ela desnudar serão a chave do seu poder”, canta ela em “Greatest threat to the status quo” – e sonoridade singular , que chama de “jazz on dub”. Coerentemente, seu mais recente trabalho foi o levitante álbum “Mad Professor meets Jah9 in the midst of the storm”, feito em parceria com o mago dos efeitos especiais, lançado ano passado.
– Sou uma poeta que canta, influenciada por musas como Nina Simone e Erykah Badu, e também por mestres do dub, como Jah Shaka, Mad Professor e King Tubby. Jazz on dub é a mistura de tudo isso – explica ela, que também dá aulas de ioga ao som dessa psicodélica vertente do reggae. – Respiração é a base de tudo na ioga. E dub, de certa forma, é o reggae respirando por entre os espaços.
(Foto de divulgação)