O desabrochar de Noga Erez

Noga Erez_Ron Kohen

A chuva cai fina e insistente em frente ao palco Tendências, na Praça XV, em meio ao que sobrou da programação cultural dos Jogos Vorazes do Rio, ceifada pelo Inominável. Por causa dela, o show de Noga Erez, marcado para 16h, está duas horas atrasado. O vai e vem das pessoas saindo do trabalho é constante. Algumas freiam para acompanhar a competição de ginástica olímpica, exibida num telão próximo. Já está escuro quando finalmente a artista israelense surge, discreta, aciona o teclado e começa a tocar sua versão para “Weapons”, de Son Lux (projeto do norte-americano Ryan Lott). A batida é quebrada, “molhada” por efeitos que Noga e o percussionista Ran Jacobovitz, que a acompanha, adicionam, enquanto a voz, suave e ao mesmo tempo firme, navega pela letra: “Put down all your weapons/Let me in through your open wounds” (“Abaixe suas armas/Deixe-me entrar por suas feridas abertas”). Ela emenda com “Same things”, do seu próprio repertório, que segue a mesma onda. Aos poucos, grupos vão se juntando em frente ao palco e a happy hour no Centro da cidade vai ficando docemente melancólica e narcótica.

– “Weapons” tem um significado muito grande para mim e não tenho como deixar de tocá-la nos meus shows – me diz Noga, por telefone, antes da apresentação.

De fato, essa versão foi, com perdão do trocadilho, a arma com que a cantora, tecladista e percussionista de 26 anos derrubou a barreira do anonimato. Gravada em 2014, durante uma turnê de Son Lux por Israel, a música viralizou no YouTube e fez com que Noga deixasse de vez seu passado como integrante do grupo de folk/jazz The Secret Sea e investisse num trabalho à base de samplers e programações eletrônicas. Tudo se consolidou com outra regravação, “Where did you sleep last night”, do folk/bluesman Leadbelly, revista pelo Nirvana no álbum “Unplugged in New York”, de 1994, também destaque no boca a boca on-line.

– Apesar de ter tido medo de ficar categorizada como artista de covers, foram realmente dois momentos decisivos na minha vida profissional. A partir deles, mergulhei mais fundo no trabalho com o (programa) Ableton Live, com a ajuda do meu parceiro de composições Ori Rousso. Desde então, tem sido um aprendizado diário – conta ela, que tocou no Primavera Sounds deste ano, em Barcelona, e completa a turnê brasileira com shows em Curitiba (11/08), São Paulo (13/08) e Piracicaba (14/08).

Um aprendizado que, mesmo recente, já vendeu frutos. Apesar de ter apenas duas músicas próprias disponíveis – “Same thing” e “Levontin”, além de “Weapons” e “Where did you sleep last night” estão no soundcloud – Noga foi contratada pelo selo alemão City Slang, o mesmo de Arcade Fire, Broken Social Scene, CocoRosie e Caribou. Fã também de outro selo, Brainfeeder, de Flying Lotus (“Adoro tudo que sai por ali, em particular as coisas de Tokimonsta”, diz) e já comparada a nomes como Björk e FKA Twigs (“Isso é muito doce, mas claramente um exagero”, suaviza), seu álbum de estreia deve sair até o fim do ano, produzido por ela e Rousso.

– As coisas estão acontecendo muito rápido, mas é isso, esse fluxo para a frente, que está me impulsionando, me fazendo trabalhar sem parar. A pressão pode ser bem criativa.

(Foto de Ofer Dabush)